Alberto Eiguer
Publicado em O Estado de S. Paulo:
Um dos precursores da terapia familiar, o psicanalista francês Alberto Eiguer, presidente da Associação Internacional de Psicanálise de Casal e Família, afirma que esse tipo de terapia ainda é desconhecido e fonte de temores, como o da perda de autoridade para o terapeuta. Mas a ajuda profissional evita o caminho da violência. “As famílias que vivem um conflito muitas vezes acham que o melhor é não falar, não contar, não explicar”, disse o especialista, que esteve no Brasil para evento da ONG Instituto Rukha, que dá auxílio psicológico à famílias vulneráveis.
Existem até reality shows para ensinar as famílias a dar conta de suas dificuldades. O que isso mostra sobre elas?
Sim. E têm muito sucesso. Isso mostra que as famílias precisam avançar na discussão dos problemas que têm. Porque as famílias têm problemas e eles existem não só entre os casais, mas entre pais e filhos, entre os irmãos, há ainda as questões relacionadas aos avós. Isso mostra que as famílias necessitam de especialistas que as orientem. Questões de autoridade, como conseguí-la. E para o momento em que a autoridade passa a ser violência, o que aumentou bastante ultimamente.
Mas terapias familiares são pouco utilizadas, mesmo pelo sistema públicos de saúde.
As terapias familiares não são tão conhecidas quanto deveriam. Os pais têm um certo orgulho de poderem educar seus filhos sozinhos e a terapia os leva a colocar em xeque sua própria capacidade. Uma das tarefas do terapeuta é mostrar que ele não substitui o pai e a mãe, mas os ajuda a exercer plenamente a paternidade.
Perder a autoridade é o medo mais comum?
Sim, o segundo é que têm medo de mostrar suas fraquezas. As famílias que vivem um conflito muitas vezes acham que o melhor é não falar, não contar, não explicar.
O que diferencia a terapia familiar psicanalítica?
O terapeuta busca esclarecer os aspectos que estão na origem das dificuldades e não estão claros. Utiliza-se de interpretações, por diferentes métodos. Há um método em que é feito um desenho coletivo da casa, como um plano arquitetônico, o que permite ver muitas coisas que são inconscientes, trazer muitas perspectivas.
No País, cerca de 30% dos lares têm mulheres como chefes.
A monoparentalidade é um fenômeno atual. A presença de dois pais permite que os problemas dos filhos sejam divididos, mas nas famílias monoparentais os filhos podem tentar poupar a mãe, porque sabem de suas dificuldades.
Mas mesmo em famílias com pai e mãe, a figura do pai muitas vezes tem menos importância.
Os pais têm de encontrar um lugar em que sejam necessários. Na sociedade tradicional, a posição do pai antes era soberana, prestigiosa. Agora o pai tem dividir e lutar para conseguir seu lugar. Há situações em que, por exemplo, ganham menos ou estão desempregados. Mas veja como há diferenças até no modo como a mãe e o pai banham o bebê. A mãe com mais ternura, o pai com mais vigor, o que permite que eles se diferenciem.
O senhor veio falar de famílias vulneráveis, vítimas de múltiplas privações. Como recuperá-las?
A luta por sobreviver, ganhar dinheiro todos os dias, faz com que os pais não possam se ocupar da educação, do lazer. Um tipo de problema comum nessas famílias é a dificuldade de se divertir junto. Quando as pessoas têm de se ocupar em sobreviver, pensam que não podem se dedicar ao lúdico. E muitos problemas vêm daí. Mas podem. Além disso, há a falta de perspectiva de futuro. O resultado de tudo é que a família não sabe para que está junta.
A terapia dá espaço para refazer o sentido de estar junto?
Sim. Por isso, desenvolvo um trabalho que se chama por uma terapia familiar recreativa, no sentido de buscar o lúdico. Cada família tem de ter um sentido geral e deve buscar constantemente a melhor maneira de viver junto.
Discutindo os pequenos e grandes aspectos?
Muitas famílias dão importância aos pequenos problemas e não aos grandes.